Categoria: Santos do dia

  • Um perpétuo mês de Maria

    No mês de maio, mês de Maria, comentava Dr. Plinio, sente-se uma particular proteção de Nossa Senhora estender-se sobre todos os fiéis, uma alegria que brilha e ilumina nossos corações, exprimindo a certeza dos católicos de que o indispensável patrocínio de nossa Mãe celestial se torna, durante esse período, mais solícito, mais amoroso, mais cheio de visível misericórdia e exorável condescendência. 

    Tais sentimentos nutriram a devoção de Dr. Plinio à Santíssima Virgem, desde os anos de sua infância quando, numa penosa conjuntura, viu-se pela primeira vez amparado pela clemência da Auxiliadora dos Cristãos. A Ela passou a recorrer constantemente e, de modo especial, durante o “mês de Maria”, celebrado no Colégio São Luís onde ele estudava, assim como em todas as paróquias. Já homem feito, recordaria com saudades aquelas fervorosas homenagens tributadas à Mãe de Deus:

    “As igrejas ficavam repletas, tomadas pelos membros de associações religiosas consagradas a Nossa Senhora — Filhas de Maria, Congregados Marianos, etc. —, além da multidão de fiéis que, nas noites de maio, compareciam a ditas cerimônias. Em geral, o sacerdote puxava o Terço e outras orações, entremeadas de cânticos em louvor da Virgem. Em seguida, o padre, do alto do púlpito, dirigia algumas palavras à assembléia, exaltando as augustas virtudes de Maria e exortando os paroquianos a imitá-La.

    “Na seqüência, o momento culminante da celebração com a Bênção do Santíssimo. O sacerdote, revestido de belos paramentos brancos, tomava em suas mãos o ostensório que esplendia raios dourados e, em movimentos solenes, meio envolto nas névoas perfumadas do incenso, traçava no ar o Sinal da Cruz para todos os lados da igreja. Logo depois, depositava o ostensório sobre o altar, recitava as orações prescritas para o encerramento da bênção e, terminadas, guardava novamente o Santíssimo Sacramento no tabernáculo. A cerimônia chegara ao fim. As associações religiosas se retiravam pela sacristia e cada um voltava para sua casa.

    “A meu ver, porém, talvez um dos aspectos mais bonitos de tudo aquilo era essa post-cerimônia: o templo que se esvaziava, ecos de cântico religioso ainda ressoando no seu interior, resquícios de incenso flutuando no ar, o sacristão que ia apagando as várias luzes, balançando suas chaves, conferindo se ninguém esquecera algo sobre os bancos ou nos confessionários. Então só restavam ali as almas aflitas, as almas recolhidas diante desse ou daquele altar lateral: ora uma senhora muito idosa, vergada pelo peso das provações, ora um rapaz corpulento, saudável; um obeso senhor de meia idade, uma mãe de família igualmente madura, ou um menino — todos elevando uma premente súplica à Homenageada da noite.

    “Afinal, o sacristão balançava com mais força o seu molho de chaves, e aquelas pessoas entendiam que era preciso sair. Lá fora, pelas ruas já despovoadas, podia-se acompanhar os últimos fiéis que se dispersavam: a senhora idosa com sua bolsa estreitada ao corpo, o homem obeso com ar sofrido, o rapaz alegre e esperançado, distanciando-se, como se fossem as derradeiras bênçãos daquela cerimônia que se dirigiam para os vários cantos da cidade. Atrás ficava a igreja, fechada, com sua torre voltada para o céu, sob as nuvens tocadas de luar, à espera da manhã seguinte em que abriria de novo suas portas.

    “No dia 31 de maio dava-se o magnífico encerramento do mês de Maria, quando a imagem da Virgem, posta sobre um andor emoldurado de flores, era solenemente coroada. Enquanto um “anjinho” trazia numa almofada a coroa para colocá-la sobre a cabeça da imagem, o povo, genuflexo, acompanhava os cânticos entoados pelo coro, acentuados pelo timbre do órgão tocado à “toute volée”. Depois, conduzida por algumas pessoas, a imagem coroada percorria o recinto da igreja, seguida pelo celebrante revestido com paramentos de gala. Outras orações, outros cânticos, e tudo estava terminado.

    “Todos se despediam de maio com imensas saudades. Gostariam que o ano inteiro fosse um perpétuo mês de Maria. E eu espero que, quando vier para o mundo aquela época luminosa e marial do triunfo do Imaculado Coração da Santíssima Virgem, prometida por Ela em Fátima, tenhamos nós esse imenso mês de Maria, em que todos os dias se preste homenagem a Nossa Senhora e cante-se sua glória como Rainha do Universo.”

  • Nunca se ouviu dizer…

    No mês de maio, mês de Maria, conforme dizia Dr. Plinio, “sente-se uma proteção especial de Nossa Senhora se estender sobre todos os fiéis, e uma alegria que brilha e ilumina nossos corações, exprimindo a universal certeza dos católicos de que o indispensável patrocínio de nossa Mãe celestial se torna, durante esse período, ainda mais solícito, mais amoroso, mais cheio de visível misericórdia e exorável condescendência”.(1)

    Condescendência e misericórdia maternais que imploramos com plena confiança ao longo do “Lembrai-vos”, oração atribuída a São Bernardo de Claraval, e por Dr. Plinio não só recitada diversas vezes ao dia, mas também incansavelmente recomendada a seus filhos espirituais. Ouçamo-lo:

    “Cumpre analisarmos e compreendermos as magníficas palavras dessa prece: Lembrai-Vos ó piíssima Virgem Maria, que nunca se ouviu dizer, que algum daqueles que têm recorrido à vossa proteção, implorado vossa assistência e reclamado o vosso socorro, fosse por Vós desamparado.

    – é bastante categórica; “algum daqueles”, ou seja, qualquer um, ao longo de dois mil anos de história da Igreja;

    – proteção, assistência, socorro: proteção para evitar que a tentação venha, assistência é um auxílio numa situação difícil,

    – socorro é para uma pessoa que se acha periclitando, sumindo, afundando. Pois bem, “nunca se ouviu dizer que, tendo alguém pedido proteção, assistência e socorro a Nossa Senhora, fosse por Ela desamparado”.

    “Animado eu, pois, com igual confiança, a Vós, ó Virgem entre todas singular, como a Mãe recorro, de Vós me valho”.

    Quer dizer, se Vós nunca deixastes de proteger a ninguém, aqui estou eu, um ente humano, batizado na Igreja Católica; sou vosso filho, venho vos pedir auxílio, estou tentado, tive culpa, digamos que até caí perante uma tentação. Porém, continuo vivo, a vossa clemência me mantém neste mundo e, portanto, tenho o direito e o dever de rezar a Vós. Eis-me aqui, repleto de confiança na vossa misericórdia.

    “E, gemendo sob o peso de meus pecados, me prostro a vossos pés”.

    Note-se como é animadora essa expressão. Não diz: ‘Eu, o inocente, o puro, o límpido; eu, o homem sem mancha, me dirijo a Vós e peço socorro. A minha inocência me dá direito a vosso auxílio’. Não. ‘Gemendo sob o peso de meus pecados’. Ou seja, são tantas faltas que elas me prostraram no chão. Estou caído ao solo sob o fardo delas, e este me oprime de tal modo que eu chego a gemer. Ora, ‘gemendo sob o peso de meus pecados’, o que faço eu? ‘Prostro-me a vossos pés’. Venho para junto de Vós, minha Mãe, e a Vós me agarro, na opressão de meus pecados.

    Em seguida, a conclusão: “Não desprezeis as minhas súplicas, ó Mãe do Verbo de Deus humanado, mas dignai-Vos de as ouvir propícia e de me alcançar o que Vos rogo. Amém”.

    O pensamento é lindo. Dignai-Vos de ouvir com benignidade, com bondade, o que eu estou suplicando. De vossa parte eu espero um sorriso e que me alcanceis aquilo que Vos peço.

    Essa é uma tocante e filial manifestação da confiança de qualquer alma, em qualquer estado, posta em qualquer situação, para com Nossa Senhora. Confiança que a reveste de ânimo e a faz se voltar à Santíssima Virgem, certa de receber o socorro da Virgem. O raciocínio que essa súplica encerra é simples: “Vós nunca abandonastes ninguém. Ora, eu sou alguém; logo, Vós não me abandonareis”. Trata-se de uma reflexão a mais lógica, concludente e convincente possível; a mais singela na sua esquematicidade e a mais irresistível, expressa numa linguagem de fervor e devoção.

    “Assim, resta-me fazer essa recomendação, jamais supérflua: nunca, nunca, nunca deixemos de rezar a Nossa Senhora. É preciso invocá-La, é necessário que a Ela sempre recorramos, máxime nos momentos difíceis de nossa existência. Seja nas horas de tentações, de provações, angústias e sofrimentos, seja nos problemas comuns de todos os dias, Ela nos ajudará. E se, por infelicidade, sucumbirmos à tentação, redobremos de ânimo e brademos: ‘Lembrai-Vos ó piíssima Virgem Maria!’

    “Ela, a melhor de todas as Mães, terá compaixão de nós, seus filhos, e nos reerguerá com um sorriso repassado de solicitude e carinho inimagináveis.”

    1) Última Hora, 7/5/1984

  • Sagrada Família: três auges de perfeição

    Na humilde casa de Nazaré verificava-se uma ascensão em graça e santidade, perante Deus e os homens, das três pessoas excelsas que ali moravam. Três perfeições que alcançaram o auge ao qual cada uma devia chegar. Eram três auges desiguais, que se amavam e se intercompreendiam de modo intenso, e que constituíam uma hierarquia — disposta pela Divina Providência — admiravelmente inversa: o chefe da casa no plano humano era o menor na ordem sobrenatural; e o menino, que devia obediência aos pais, era Deus.

    A Sagrada Família, modelo de todas as famílias, compunha-se portanto de três perfeições altíssimas, magníficas, mas distintas, realizando uma extraordinária harmonia de desigualdades, como nunca houve nem haverá semelhante na terra.

  • Senso da presença de Deus

    Santa Isabel foi dotada pelo Espírito Santo de um dom que a fez sentir a presença do Menino Jesus em Nossa Senhora.

    Em certa medida, o verdadeiro católico também recebe essa graça, de tal forma que, quando a ela corresponde, ele deve saber discernir onde está e onde não está Deus, não física, mas moral e sobrenaturalmente. Todo autêntico membro da Igreja deve ser munido de um senso tal, que lhe indique quando as coisas são ou não segundo Deus.

    Para isso não é preciso ter grande cultura, inteligência ou conhecimento teológico; basta ter este verdadeiro senso católico, privilégio dos que correspondem à graça do batismo. Disto Santa Isabel nos dá um maravilhoso exemplo ao perceber a presença do Menino Jesus no claustro materno de sua Santíssima prima.

     

    Plinio Corrêa de Oliveira, (Extraído de conferência de 2/7/1970)

  • Maria… fora de comparação!

    “De Maria nunquam satis”. Com esta curta mas expressiva frase, afirma São Bernardo que nunca se louvou, exaltou, honrou, amou e serviu suficientemente a Maria. Dr. Plinio demonstrou sempre grande entusiasmo por esta tese. Apesar de sua imensa capacidade de expressão, gostava ele de reafirmar a insuficiência do vocabulário humano para exaltar convenientemente a Rainha do Céu e da Terra.

     

    Neste mês de Maio, mês de Maria, nossos leitores gostarão certamente de conhecer uma significativa amostra dessas manifestações de devoção mariana. Para tanto, transcrevemos um pequeno trecho de seus comentários sobre o “Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem”.

    Sendo Deus “Aquele que é”, nunca se passou nada que, de longe, pudesse ser tão importante como a Encarnação do Verbo. Este é um fato relacionado com a própria natureza divina, e tudo que diz respeito a Deus é incomparavelmente mais importante do que tudo que diga respeito ao homem. A Encarnação de Deus a tudo transcende em importância.

    Por este motivo, o papel de Nossa Senhora na Encarnação situa bem o papel d’Ela em todos os planos divinos, e precisamente no que eles têm de mais importante e de mais fundamental.

    Achamos admirável, por exemplo, Nosso Senhor ter escolhido Constantino para tirar a Igreja das catacumbas. Mas o que é isto, perto de ter escolhido Nossa Senhora para n’Ela ser gerado?  Absolutamente nada! Admiramos muito o Pe. Anchieta, porque ele evangelizou o Brasil. Mas o que é evangelizar um país, em comparação com o cooperar na Encarnação do Verbo? Nada!

    Digamos que se tratasse de salvar o mundo de sua crise atual e de restabelecer o reino de Cristo, e suponhamos que Nosso Senhor escolhesse um só homem para esta tarefa. Nós acharíamos esta missão algo de formidável, e com razão. Mas, o que seria isto em comparação com a missão de Nossa Senhora? Nada! Ela situa-se num plano que está fora de comparação com a missão histórica de qualquer homem. A respeito de Nossa Senhora é-se sempre obrigado a repetir a expressão: “fora de comparação”, porque Ela faz estalar todo o vocabulário humano. Há uma tal desproporção entre Ela e todas as demais criaturas, que a única coisa segura que se pode dizer é que é “fora de comparação”…

    * * *

    Estava já em fase final de preparação este número de nossa Revista quando o Papa João Paulo II presenteou o orbe católico com a encíclica Ecclesia de Eucharistia (A Igreja vive da Eucaristia),  datada de 17 de abril, Quinta-Feira Santa. Nesse luminoso documento,  o Papa ressalta a suprema importância do Sacrifício do Altar, centro e ápice da vida cristã, e incita os fiéis do mundo inteiro  a darem todo o valor devido a este imenso dom de Deus, que é a presença real de Cristo na Eucaristia.

    Por uma feliz coincidência, é este o tema da seção “Dr. Plinio comenta”: a grande alegria que dá a Jesus Cristo quem O recebe na Comunhão, ou ao menos faz uma curta visita ao Santíssimo  Sacramento, e a estreitíssima intimidade que Ele estabelece com a alma que O recebe.

    Em consonância com os anseios manifestados pelo Santo Padre em sua valiosa encíclica, trataremos mais amplamente do tema da Eucaristia no próximo número, mês da festa do Corpo de Deus.

    Plinio Corrêa de Oliveira

  • A mediação universal de Nossa Senhora

    O  meio para atingirmos a finalidade de nossas vidas é sermos devotos de Nossa Senhora. Ela é medianeira de todas as graças; todos os nossos pedidos vão a Jesus Cristo, Nosso Senhor, por meio d’Ela.Isso se exprime de um modo característico com um axioma da Teologia: um pedido feito a Deus por todos os anjos e santos, em conjunto, ao qual Nossa Senhora não se associe, não é atendido. Porém, se Ela pedir sozinha será atendida.

    Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência  de 28/10/1990)

  • Ponde em mim os olhos de Vossa piedade

    Minha Mãe, eu sei bem, ou ao menos julgo saber bem, quais são os meus defeitos. Receio, porém, ter uma noção hipertrofiada de minhas qualidades. Vós bem sabeis como é uma coisa e como é outra.

    Não me interessa saber até que ponto minhas qualidades podem me obter o que eu preciso; nem me interessa saber até que ponto meus defeitos atraem sobre mim punições que eu poderia não sofrer se eu não os tivesse. Porque Vós vedes tudo isso e Vós rezais por mim com empenho de Mãe de Misericórdia. E onde entram os vossos méritos e a vossa súplica, o contributo de minha súplica é uma gota de água.

    Entretanto, Vós quereis a oração de vossos filhos. Olhai, pois, para as minhas necessidades, elas são um bramido que se levanta a Vós, pedindo-Vos aquilo que eu preciso.

    Tende pena de mim, ponde em mim os olhos de vossa piedade, e atendei-me.

    Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 22/11/1988)

  • O mês de maio e o Reino de Maria

    No mês de maio, as festas em honra de Maria Santíssima eram celebradas com muito esplendor e deixavam saudades em todos os fiéis. O Reino de Maria será um imenso mês de Nossa Senhora, e em todos os dias se comemorarão as grandezas da Rainha do Universo.

     

    Sendo o mês de maio dedicado especialmente à Santíssima Virgem, gostaria de tratar sobre a festa, outrora comemorada no dia 31 de maio, de Nossa Senhora Rainha, que é a festividade do Reino de Maria.

    Dar glória a Deus

    Este Reino é algo tão transcendental, tão grande, de tal modo ligado à eternidade, que toda borrasca terrena pode ir e vir, desencadear-se e resolver-se, mas o Reino de Maria permanece eternamente, sólido e brilhando na sua glória intrínseca, de maneira tal que todas as injúrias, as propagandas adversas não podem nada contra ele.

    O que vem a ser propriamente a Realeza de Maria? E por que a Igreja instituiu esta comemoração? Ela a estabeleceu com duas intenções. A primeira é de dar glória a Deus, por meio de Nossa Senhora, a propósito do assunto da própria festa. Assim, por exemplo, a solenidade de Corpus Christi foi estabelecida para dar glória a Deus — sempre por meio de Maria Santíssima, porque Ela é a Medianeira universal de todas as graças — pela instituição do Santíssimo Sacramento, pelo fato de a Igreja ter sido adornada, enriquecida e vivificada por esse Sacramento admirável, ou seja, a Sagrada Eucaristia.

    Assim também a Igreja estabeleceu uma festa para a Realeza de Nossa Senhora porque ela quer dar glória a Deus pelo fato de Maria Santíssima ser Rainha. Então ela festeja, canta, com um ato de amor e de culto, toda essa glória que Deus recebe por essa realeza da Santíssima Virgem. E enquanto católicos, temos que nos associar, evidentemente, a essa atitude da Igreja.

    Anteriormente fora escolhido para esta comemoração o dia 31 de maio para, desta forma, fechar com chave de ouro o mês de Maria, completando assim todas as honras que a Santíssima Virgem recebeu durante esse mês, aclamando-A Rainha, depois de terem sido ditas todas as outras maravilhas em louvor a Ela. Isso implica em proclamar a mais alta glória d’Ela, abaixo da honra de ser Mãe de Deus e dos homens: ser a Rainha dos homens e a escrava de Deus Nosso Senhor.

    Assim, a festa da Realeza de Maria tem um alcance muito grande. A Igreja espera do interior de nossas almas uma alegria, uma satisfação, uma homenagem, uma honra a Nossa Senhora como Rainha.

    Concentrar a atenção na realeza de Maria

    Acrescenta-se a isso um segundo objetivo: a cada ano que passa essa festa se repete. Desta maneira, a Igreja — conhecedora da facilidade com que o espírito humano se dispersa e se volta para coisas às quais não deveria se voltar — obtém um meio de concentrar novamente a atenção de seus filhos sobre esta realidade: Nossa Senhora é Rainha.

    Eis porque a Igreja organizou, ao longo dos séculos, o calendário litúrgico, consagrando cada dia do ano ao culto de vários Santos, alguns dias a determinados mistérios da Religião Católica, e também a alguns títulos de glória de Nosso Senhor Jesus Cristo e de Nossa Senhora.

    Assim, a cada ano que passa, a Igreja pede a todos os seus filhos que se recolham de modo especial e pensem, meditem na realeza de Maria Santíssima.

    Esses dois objetivos se ligam, porque ninguém pode amar o que não conhece. Portanto, não pode amar a realeza de Maria quem não a conhece. É preciso pensar nela, refletir a respeito dela, para depois amá-la.

    A concentração do espírito, o pensamento, a reflexão antecipam o ato de amor. A Igreja pede que reflitamos, nos concentremos, para depois fazermos um ato de amor, e com isso darmos a Nossa Senhora a glória pelo fato de Ela ser Rainha.

    Vemos, assim, como na Santa Igreja tudo é bonito, bem pensado. Quanta harmonia, quanta profundidade, quanta serenidade, quanta nobreza, quanta força há em todas as coisas da Igreja! Mesmo em meio aos terríveis torvelinhos pelos quais a Igreja Católica possa passar, ela é ela, a Igreja imortal. E sempre conservará a santidade que lhe é própria até o fim do mundo, porque ela é indestrutível. Um dos aspectos dessa santidade é exatamente o conservar a festa da Realeza de Maria.

    As cerimônias de outrora ao longo do mês de maio

    Os que não alcançaram o mês de Maria, como tradicionalmente se realizava até uns quinze anos atrás, não têm ideia de como era uma verdadeira maravilha.

    Toda noite, em geral por volta das 7h30 — os horários variavam um pouco —, em todas as igrejas, e mesmo nas capelinhas do campo, realizavam-se cerimônias em honra de Nossa Senhora.

    A cerimônia constava fundamentalmente do seguinte: as associações religiosas — filhas de Maria, congregados marianos e outras congregações consagradas a Nossa Senhora — ocupavam inteiramente os bancos da igreja, de um lado e de outro. O sacerdote subia ao púlpito, portando sobre a batina a roquete: aquela espécie de meia túnica branca com rendas, que os padres usavam.

    Do alto do púlpito o sacerdote rezava em silêncio, enquanto o coro entoava a “Ave Maria”. O padre mantinha-se ajoelhado no púlpito, e todo o povo, de joelhos também, constituindo uma massa popular enorme que enchia a igreja, ocupando todos os espaços, até para fora dos bancos.

    Todos cantavam a “Ave Maria”, pedindo graças para o sacerdote pregar com bastante unção sobre a Santíssima Virgem. Terminado o cântico, ele iniciava o sermão.

    Após a prédica, o coro recomeçava a cantar, entoava a ladainha de Nossa Senhora e outras orações em louvor a Ela.

    Ao final, era dada a bênção do Santíssimo Sacramento. O momento culminante da cerimônia ocorria quando o sacerdote se voltava para o povo, portando nas mãos o ostensório sob a forma de sol com raios de ouro, dentro do qual estava o Santíssimo Sacramento, e, diante de todo o povo genuflexo, dava a bênção, voltando-se com a Hóstia Sagrada para todos os lados da igreja.

    Depois depositava o ostensório novamente sobre o altar, ajoelhava-se, rezava algumas orações e guardava o Santíssimo Sacramento no sacrário.

    Em seguida, o sacerdote saía enquanto o coro cantava. A igreja estava tomada pelo perfume do incenso, largamente utilizado durante a bênção do Santíssimo para adorar a Sagrada Hóstia.

    Atmosfera abençoada que se difundia

    As associações religiosas se retiravam pela sacristia, e as pessoas retornavam para suas casas.

    Entretanto, ficavam ainda alguns fiéis rezando na igreja. Era talvez um dos aspectos mais bonitos. Na igreja quase vazia, ouviam-se remanescentes de melodias sacras, sentiam-se restos de incenso flutuando pelo ar, o sacristão ia aos poucos apagando as várias luzes do edifício sagrado, revistando os confessionários, atrás dos altares, para ver se não ficara alguém nesses locais, e ia assim preparando a igreja para ser fechada.

    Até esse momento, permaneciam ainda algumas almas aflitas, recolhidas diante deste ou daquele altar: ora era uma velhinha, ora um rapagão imenso, ora um senhor obeso e atingindo largamente os seus 50 ou 60 anos, ora uma mãe de família de meia idade, ora uma criancinha. Todos rezando com afinco junto a uma imagem e pedindo uma graça espiritual ou temporal, de que muito necessitavam.

    Por fim, o sacristão aparecia e, para dar a entender que era preciso sair da igreja, ao invés de pôr as pessoas para fora, ele sacudia um molho de chaves. Todos entendiam que era preciso sair, e só então o templo esvaziava. Quer dizer, os filhos da Igreja ficavam dentro dela o tempo que pudessem.

    Quando terminava a bênção, eram 9h, às vezes 9h30, hora relativamente tardia para a São Paulo daquele tempo. Nas ruas desertas, podiam-se acompanhar os últimos fiéis que saíam, andando devagarzinho: uma senhora com uma bolsa na mão, mais adiante um homem com ar sofrido, outro que estava alegre, esperançado, dispersavam-se aos poucos como se fossem as últimas bênçãos da igreja que se difundiam para os vários cantos da cidade.

    O relógio da torre da igreja: símbolo da relação entre o pensamento da Igreja e o do homem

    Ficava aquela torre voltada para o céu, o relógio indicando as horas noite adentro, silêncio em volta, as nuvens, a Lua, o tempo, tudo passando à espera da manhã seguinte, quando o templo abrisse de novo as suas portas, de madrugadinha, e em que se vissem muitas daquelas mesmas pessoas da véspera voltarem, às vezes nas madrugadas frias e ventosas de São Paulo, e entrarem na igreja que representava, ao mesmo tempo, um refúgio para a alma e um abrigo contra as ventanias que sopravam sobre o corpo. Iniciava-se, então, uma cerimônia religiosa ainda mais augusta e mais solene do que a da véspera: a Missa. Era a vida da igreja que recomeçava quando a cidade acordava. Era uma verdadeira beleza!

    O simbolismo do relógio na torre das igrejas é lindo! Não é direta e principalmente para que o transeunte o olhe e veja que horas são; tem acidentalmente também essa finalidade, mas o objetivo principal é outro. Os pequenos relógios particulares eram menos pontuais do que os grandes que encimavam as torres. Por isso, estes serviam para que todos acertassem por ele os ponteiros dos relógios cambaios.

    Esse era o símbolo da relação entre o pensamento da Igreja e o do homem. O homem acerta o seu pensamento pelo da Igreja — porque a Igreja não erra nunca, e ele pode errar —, assim como acerta o seu relógio pelo relógio estável, que os padres mantinham pontual. Essa era a beleza do relógio da torre da igreja.

    A coroação de Nossa Senhora

    No encerramento do mês de Maria, no dia 31, em todas as igrejas, Nossa Senhora era coroada Rainha. Colocava-se no presbitério, bem na frente, uma pequena construção artística, de madeira, que variava de acordo com a imaginação e o gosto do vigário e das pessoas da paróquia, mas comportava essencialmente um lugar muito alto onde havia uma imagem da Santíssima Virgem toda cercada de flores, uma escadinha por onde, em geral, uma criança levava uma coroa e com ela coroava Nossa Senhora Rainha.

    Todo o povo permanecia genuflexo, o órgão tocando a todo volume, o coro cantando, proclamava-se, assim, a realeza de Maria Santíssima.

    Feita a coroação, um grupo de pessoas designadas pelo vigário tomava a imagem de Nossa Senhora e formava um cortejo; o vigário ia atrás com a capa magna, e davam uma volta pelas várias naves da igreja com a imagem coroada. Em seguida, colocavam-na de novo no seu trono. Depois disso vinham diversas orações, e estava terminado o mês de Maria.

    O mês de Maria acabava deixando umas saudades enormes! Todo mundo gostaria que o ano litúrgico inteiro fosse um perpétuo mês de Maria.

    Eu espero que quando chegar o Reino de Maria isso seja assim, e que da vitória de Nossa Senhora, prevista em Fátima, até o fim do mundo nós tenhamos um imenso mês de Maria, em que todos os dias a Santíssima Virgem seja festejada e se aclame a glória d’Ela, vista como Rainha do Universo.  v

     

    Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 31/5/1975)

    Revista Dr Plinio Maio de 2015

  • O Santíssimo Sacramento e a misericórdia de Nossa Senhora – II

    Maria Santíssima é Mãe de misericórdia e nos considera com bondade indizível. O auge da bondade d’Ela não está em nos deixar no pecado e nos olhar com compaixão, mas em nos obter graças pelas quais recebemos forças para sair do pecado e não mais ofender a Deus.

     

    Na realidade, o homem encontra-se numa situação tal que lhe convém ser tratado com justiça, e por isso ele deve gostar de um trato que tenha a nota tonificante de justiça. A qualidade que ele tem lhe será reconhecida, e seu defeito também lhe será mostrado; tudo graduado de acordo com o que merece. Isso fortalece, faz bem, eleva o homem.

    A importância de um braço amigo que nos sustente durante a prova

    Por mais que isto seja assim, entretanto há momentos — e quantos são esses momentos! — em que a fraqueza humana aparece e o homem faz a seguinte reflexão: “Eu sei que deveria agir de tal modo e não fazer outra coisa. Vejo o peso que isto representa, e precisaria realizar um sacrifício. Porém esse sacrifício me dói. Estou disposto a fazê-lo aos poucos, mas como me faria bem se eu notasse que um olhar bondoso participa da minha dor e me diz: ‘É bem verdade, você tem que fazer esse sacrifício e a mim me dói. Eu até tomo sobre mim uma parte de seu sacrifício. Entretanto, meu filho, algo é intransferível e tem de ser feito por você, para sua glória, para seu bem. Você seria roubado se lhe fosse tirada a possibilidade de sacrificar-se. Faça o sacrifício, mas eu o olho com afeto, com compaixão durante esse tempo. Vamos para frente e coragem!’”

    O homem, tratado assim durante a prova e na dor, recebe uma comunicação da força do outro. É como uma pessoa sem firmeza para andar, mas que é sustentada pelos braços de outrem. O passo é vacilante, ela anda, mas precisa de um apoio, um braço amigo que a sustente. Como não dizer “muito obrigado”? Como não sentir-se bem junto a esse braço amigo que ajuda? É evidente.

    O inesgotável amor materno

    Esse é bem o papel de Nossa Senhora. Ela é insondavelmente misericordiosa! Na ladainha ao Sagrado Coração de Jesus, uma das invocações é: “Cor Jesu, patiens et multæ misericordiæ, miserere nobis — Coração de Jesus, paciente e muito misericordioso, tende compaixão de nós”. A fonte de todas as virtudes é Ele. E na misericórdia, como em tudo o mais, Ele está infinitamente acima de Maria Santíssima.

    Mas querendo fazer os homens sentirem, ao último ponto, a misericórdia de Nosso Senhor, Deus dispôs que ela fosse representada naquilo que é o amor mais desinteressado de que o homem pode beneficiar-se habitualmente nesta vida.

    Nas épocas normais da humanidade, notamos nas relações familiares o seguinte: às vezes, o marido pode romper com sua esposa, o pai com seu filho, o filho com seu pai, os irmãos entre si; quanto aos outros graus de parentesco nem se fala! O filho pode até romper com sua mãe, mas é raríssimo a mãe romper com seu filho.

    E esse amor materno vai tão longe, na ordem da natureza, que quando Jesus chorou sobre Jerusalém, antes de chegar ao Horto das Oliveiras, Ele disse: “Jerusalém, Jerusalém, quantas vezes Eu quis reunir teus filhos, como a galinha reúne os pintinhos debaixo das asas, mas tu não quiseste!”(1). Para exprimir o extremo do seu amor, Ele quis compará-lo ao amor materno, mas neste grau, nesta forma: uma galinha em relação aos seus pintinhos! Ele recorreu a essa figura para nos fazer compreender, de modo tocante, o que há de inesgotável no amor materno.

    Mãe das misericórdias insondáveis

    Assim, Nosso Senhor dispôs que conhecêssemos e sentíssemos em sua Mãe quintessências de misericórdias que Ele deu a Ela e que nós, simplesmente na consideração do Redentor, não chegaríamos a perceber. Porque Ele é tão alto, tão perfeito, tão divino que nosso olhar não abarca tudo. Convinha, portanto, que a misericórdia d’Ele se fizesse como que outra pessoa para nós a conhecermos bem. Esta é Nossa Senhora.

    Maria Santíssima fica tão bem ao lado de Nosso Senhor Jesus Cristo! Ela é Mãe de misericórdia, a nossa advogada. Nosso Senhor Jesus Cristo é nosso Redentor, nosso Mediador. Ele é também nosso Juiz e nos julga. E quando pensamos que Ele é nosso Juiz… Há um salmo que diz: “Si iniquitates observaveris, Domine, Domine, quis sustinebit? — Se observardes, Senhor, as iniquidades, quem, Senhor, se sustentará diante de Vós?”(2). Agora chegou o justo Juiz, perfeitíssimo, que conhece tudo, cujo olhar pousará sobre mim e verá meus defeitos… Eu adoro a exigência e a intransigência desse olhar. Mas, para usar uma metáfora, eu cambaleio e preciso que alguém me sustente.

    Perto de mim tenho uma Mãe que é d’Ele e minha, a Mãe de misericórdia, quer dizer, se toda mãe deve ser misericordiosa por natureza, a Mãe de misericórdia tem misericórdias insondáveis, incontáveis, inenarráveis, a todos os momentos e de todas as formas! Ela é tão perfeita e tão pura, que nunca deu a Ele o menor desagrado, o menor desgosto. Ela é a criatura perfeita em que Ele deitou seu olhar e A amou inteiramente, porque Ela nunca, nunca, nunca fez outra coisa a não ser corresponder à graça de um modo perfeito.

    O melhor da misericórdia de Maria Santíssima

    Qual a impostação d’Ela a meu respeito? Ela vê meus defeitos, mas não julga. Ela cobre-me com o manto e diz: “Juiz inflexível e divino, Eu vos adoro! Este é meu filho, e ainda vou dar um jeito nele. Ajudai-o, dai-lhe mais graças. Eu o amo e peço por ele. Tenho com ele um vínculo especial. Ó meu Filho, vós sabeis o que é uma mãe, pois Eu sou vossa Mãe! Com o mesmo Coração materno com que Vos amo, Eu amo a ele. Sou Eu que Vos estou pedindo!”

    E com estas palavras: “Sou Eu que Vos estou pedindo”, é claro, vem a misericórdia. Quer dizer, Nosso Senhor foi tão misericordioso que, querendo nos conceder uma misericórdia levada a um limite inimaginável, criou a Mãe d’Ele, de tal maneira que Ela pedisse por nós e obtivesse o que nós, sem Ela, não poderíamos obter.

    Temos aí o papel de Nossa Senhora, ao lado de todas as inflexibilidades de que falei. E aí encontramos a razão para esperar. Esperar o quê?

    Maria Santíssima tem pena de nós e nos considera com bondade indizível. O auge da bondade d’Ela não está em nos deixar no pecado e nos olhar com compaixão, mas em nos obter graças pelas quais nossa alma é tocada especialmente, e recebe forças correspondentes a nossa miséria para não pecar, de maneira que possamos sair do pecado. Aqui está o melhor da misericórdia: Ela, porque tem pena do pecador, dá a ele os meios de se curar. Nossa Senhora é a Rainha e o canal de todas as virtudes, a Medianeira de todas as graças. As virtudes que temos nos foram dadas porque Ela pediu. E as que não possuímos, podemos adquirir se Ela rogar por nós. 

    As mil maneiras de Nossa Senhora nos socorrer

    E o que a Santíssima Virgem fará? São mil coisas: ora será um apego que Ela faz cessar e a alma encontra o caminho livre diante de si; ora uma má companhia que Ela afasta; ora uma má influência a respeito da qual Ela nos abre os olhos e nós compreendemos que aquilo não serve; ora a nossa moleza contra a qual Ela dá de repente uma força que não supúnhamos ter e fazemos aquilo que não queríamos realizar.

    Quer dizer, Nossa Senhora age de mil modos, cada um deles previsto pela sabedoria divina e atuando na alma de uma determinada forma. O fato é que Ela vai atendendo, socorrendo o homem de maneira a torná-lo capaz de cumprir aquele dever magnífico apresentado de um modo tão estupendo pela Moral Católica, mas diante do qual, às vezes, o homem estremece.

    Rezem à Mãe de Misericórdia! Ela os ajuda a vencer, e com mérito. Porque em nenhum momento Maria Santíssima tira nossa liberdade. Se quisermos, não correspondemos à graça, mas o caminho está aplainado, o sorriso está dado e Ela chama: “Meu filho, venha!”

    Quanta misericórdia entra dentro disso! A misericórdia tem isso de próprio: ela estimula especificamente a gratidão. A quem é misericordioso temos necessidade de tratar com misericórdia. E se algum homem na vida teve misericórdia conosco, um dia em que ele precise de nossa misericórdia, será para nós uma espécie de alívio tratá-lo com misericórdia. Há uma tranquilidade para a nossa alma: encontrei uma oportunidade de ser misericordioso com ele. Os misericordiosos obterão misericórdia. 

    Plinio Corrêa de Oliveira (Extraído de conferência de 24/10/1981)

     

    1) Cf. Mt 23, 37.

    2) Sl 130, 3 (Nova Vulgata).

  • Refúgio por excelência

    Está na perfeição de Maria Santíssima ser um imenso, perene e contínuo refúgio para todos os seus filhos, de modo especial em relação aos pecadores, sejam eles quais forem, culpados de faltas leves ou graves. Tudo que diz respeito a Nossa Senhora é admirável, extraordinário, excedendo a nossa capacidade de cogitação. Assim também a sua disposição em amparar os que andaram mal, em perdoar pecados de tamanho inimaginável e ingratidões insondáveis, desde que a alma se volte para Ela e Lhe peça o maternal auxílio.

    A Mãe de Deus pode cobrir tudo, proteger tudo, alcançar toda espécie de perdão para toda espécie de crime. Ela é, na verdade, o nosso refúgio por excelência.